Andando pelo meu bairro percebi um grande terreno baldio e parei em frente a ele para olhá-lo de perto, pensei que aquilo ali poderia virar qualquer coisa: um prédio, um banco, um super mercado e a ele seriam dados outros sentidos, outros nomes, que não somente o de um simples e grande terreno vazio.
Pois, se vivemos dentro de uma cultura e estamos todos preenchidos e informados por ela, pensei, não somente objetos, coisas, seres e pessoas estão informados, mas, espaços geográficos. Refleti um pouco mais sobre isso em casa e cheguei a uma questão: o espaço é informado pelo homem e após isso ele ganha um sentido a mais, antes disso ele é somente um espaço valorizado ou desvalorizado, não pelo que ele é, mas, pela sua localização e validação capitalista.
Não é o espaço que é valorizado, mas, o que as pessoas fazem ou vão fazer desse espaço! Ele pode até ser o mesmo espaço, mas, o que as pessoas fazem ali, muda seu aspecto a cada momento do dia. O homem então informa o espaço, lhe dando assim, vários sentidos. De manhã no comércio o camelô ocupa a calçada, ela é um ponto de venda, no final da tarde o gari limpa a calçada e aquilo lá é um local de limpeza, mas à noite os mendigos dormem na mesma calçada com pouca luz, ali é seu dormitório. O mesmo espaço aqui se torna um campo para três eventos diferentes.
O espaço neste caso é o mesmo sempre, o que se constrói ali é que vai lhe dar um sentido: uma casa de família, por exemplo, vai informar o espaço de valores afetivos, sociais, interpessoais, etc. Diferentemente de um banco, caso o espaço seja ocupado por um prédio bancário, ali, as relações serão outras, serão monetárias, econômicas e exatas. Diferente também se o espaço é ocupado – ou informado – por um shopping center, as relações passam a girar em torno de consumo, propaganda, marketing, enfim, cada espaço é informado pela ação do homem, desencadeando com isso um sentido. Uma direção para aquele espaço de acordo com o que foi construído lá, para aqueles que olham de fora e passam em suas calçadas ou para aqueles que trabalham ou moram lá.
E o espaço vazio? O espaço vazio na cidade é um espaço ausente destes sentidos, ele não foi informado, torna-se então um enclave, um território clandestino, pois longe da lógica do preenchimento, para o capital, estes espaços são infrutíferos e mal vistos.
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Novamente me parece que a questão não é o espaço, mas, desta vez é: quem ocupa esse espaço e qual sua intenção. Chegamos então no homem e em suas necessidades. Logo, se o espaço vazio é informado pelo homem e essa informação é fruto de sua cultura e sua cultura tem haver com suas intenções. O espaço tende a ser o retrato da cultura hegemônica, ou o culto ao capital. Terrenos baldios por onde não fluem finanças são mal vistos pela cultura que instiga o homem a ocupá-los com coisas úteis. Resta ao homem então se perguntar se a ocupação de todos os terrenos que restam na terra irá aplacar sua vontade de preencher e dar sentido, pois um dia não haverá mais espaços no planeta. Fica aí essa reflexão.
Mas, voltando. Se a função que dou ao espaço o preenche por dentro, então, se eu resolver não dar nenhuma função a ele? E com isso nenhum sentido imediato? O que me resta então é o espaço propriamente, um local amplo e sem nenhuma função, delícia. Tirei outra foto de um desses espaços em Belém, com uma árvore bonita na frente, acho que precisamos de mais espaços assim.
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Ricardo Macêdo é artista visual e professor de artes formado pela Universidade Federal do Pará.
2 comentários:
Para falar a verdade, o Kaza Vazia é sim muito interessante quando se propoe a utilizar espaços "sub-utilizados", mas há um porém, eles não invadem locais, eles são convidados e passam a usar o local de atelie. Até aí tudo bem, não estamos cobrando que ocorram invasões, mas o potencial mais emancipatorio dessas práticas que seria o convivio comunitário, a real utilização de um espaço vira simplesmente uma galeria itinerante.
Alias, é exatamente assim que eles se autodenominam "Kaza Vazia: galeria de arte itinerante"(www.kazavazia.blogspot.com)... então caímos nessa contradiçã eles não criticam o capitalismo e muito menos o sistema da arte só tentam alternativas pra criarem novas formas de expor e vender os trabalhos.
Novamente, não há nada de errado nisso, são artistas e é isso que querem mas o Kaza Vazia não consegue dar um passo a frente nas suas práticas para além do artisto.
Alias uma possivel saída e serei justo, foi o Kaza X na ocupação Dandara e eles se proproram a criar um centro cultural e efetivamente colocaram a mão na massa: http://kazavaziax.blogspot.com/
Prática interessantissima em BH também são os Lotes Vagos (não é dificil conseguir o documentário), projeto da Louise Ganz e da Ines Linke.
http://lotevago.blogspot.com/
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