sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

GIRL TALK



Sob a alcunha de Gi
rl Talk, o produtor americano Gregg Gillis ficou conhecido por seus excêntricos mash ups, nos quais se apropria de dezenas de trechos de músicas de outros artistas, editados e rearranjados, para criar novas faixas.

Mas, para lançar cada um dos seus quatro álbuns, Gillis teria de ter desembolsado US$ 4,2 milhões com licenças para editoras e gravadoras -o que nunca aconteceu. O cálculo foi feito pelo diretor canadense Brett Gaylor em "RIP: a Remix Manifesto", documentário que parte de Gillis para discutir o direito autoral na era da informação e que agora está disponível em www.ripremix.com/ripit.

"Sempre houve uma tensão entre a internet e as ideias tradicionais que cercam propriedade intelectual"

Em "RIP", o diretor defende a chamada cultura de remix, na qual, a partir do download -seja de uma música, seja de um filme-, internautas podem transformar uma obra já conhecida em algo novo, como sugere ser o caso de Gillis. "É uma forma de cidadãos não serem mais só consumidores, mas de se tornaram criadores."

No filme, a cultura de remix é defendida pela flexibilização da atual legislação que protege a propriedade intelectual -pela qual o uso de qualquer trecho de uma música sem autorização é passível de processo.

O filme trata desde a batalha do Napster até a atuação das grandes corporações, detentoras de gravadoras e estúdios, para que as regras do jogo não mudem. O diretor ouve, entre outros, Lawrence Lessig, fundador do Creative Commons -organização que disponibiliza licenças flexíveis para obras intelectuais. Para Gaylor, tal proposta é uma das melhores alternativas para o embate dos direitos autorais.

"É uma solução razoável que permite aos artistas declararem que seu trabalho pode ser sampleado, mas sem abrir mão de seus direitos comerciais, caso a obra venha a ser usada com fins lucrativos", diz o diretor. "A única alternativa para o futuro é restaurar o equilíbrio do direito autoral. Atualmente, há muita coisa nas mãos das grandes corporações."

Em 12 de maio de 2009, enquanto ainda apresentava "RIP" em festivais de cinema, Gaylor disponibilizou o filme para download com a intenção de permitir às pessoas que "remixem, adicionem e melhorem" o documentário.

"Me inspirei no movimento do open source [código aberto], em que programadores e hackers criam softwares colaborativamente", diz Gaylor sobre o que ele chama de "cinema open source", instrumento que usou para permitir que o público interfira em seu filme. "Foi também um jeito de adotar algumas das ideias das quais o filme fala e de provar que elas podem ser um modelo novo, atual."

Brasil como exemplo

O Brasil ocupa uma significativa fatia do filme. Gaylor diz acreditar que o país tem muito a ensinar. Em passagem pelo Rio, conversou com Gilberto Gil, que levou o Creative Commons a um debate público quando ainda era ministro da Cultura. "É inspirador que a América do Norte veja isso."

Enquanto a discussão se aquece, o Girl Talk segue lançando seus discos por um selo especializado em samples, batizado de Illegal Art. E Gillis afirma que, até hoje, nunca foi processado.

Para advogado, legislação está desatualizada

Especializado em direito eletrônico e autoral, o advogado Renato Opice Blum acredita que a atual legislação sobre direito autoral está desatualizada em relação à nossa realidade. À pedido da Folha, Blum opina sobre o caso de Gregg Gillis.

"Se formos interpretar a lei literalmente, ele [Gregg Gillis] não pode utilizar trechos de outras músicas porque depende de autorização destes artistas", diz. "Mas, muitas vezes, o uso é tão pequeno, que não causa dano ao artista ou prejuízo material. Aí dependerá da interpretação do juiz que analisa o caso", afirma Blum.

Um comentário:

Bruno Cantuária disse...

Isso me fez pensar no technobrega... aí o negócio é mais embaixo.