Estereoscopia – Francelino Mesquita
“Os olhos levam o corpo
ao infinito”, nos diz o poema. E, de fato, os olhos deflagram processos
sensíveis que dão à existência humana variadas informações de ordem mnemônica,
emocional, física, espacial. As janelas anímicas inferem, em seu duplo labor, a
dimensão que aprofunda o estar no mundo, impulsionando o corpo ao deslocamento
no espaço, no sentido, e no sentimento.
Francelino Mesquita, um artista com raízes na engenharia e no
desenho arquitetônico, já apresentou nesta mesma galeria sua investigação
espacial baseada em tala de miriti. Mauritia
Flexuosa, individual de 2008, trazia proposições formais instigantes, que
flutuavam entre a escultura, a instalação, e o desenho, haja visto seu efeito
direto – as estruturas, reduzidas às suas linhas
de construção em miriti – e seus efeitos residuais – as sombras, projetadas
pela iluminação da galeria, em movimento, provocando novos desenhos.
Em Estereoscopia, o
artista aprofunda sua pesquisa no material (sai da superfície – a tala – e mergulha em sua carne íntima
– a bucha), permitindo novas
oscilações do pensamento acerca da matéria-viva, e culturalmente peculiar, do
miriti: sua leveza retrabalhada sob o escopo da densa materialidade da
escultura.
É possível considerar que a dimensão desses novos trabalhos
não permita um distanciamento tão grande dos já conhecidos brinquedos de
miriti; contudo, numa apreciação mais atenta e proximal, as seduções visuais
apresentam sua potência: a paralaxe,
distância horizontal entre as imagens captadas simultaneamente pelo olho
esquerdo e direito, dialogam com o movimento do objeto; as sombras, ainda,
cumprem sua função complementar, comentando em duas dimensões o que a
estereoscopia dos objetos quer fazer crer; o efeito tridimensional ganha,
então, sua corporeidade final, situando o trabalho de Francelino entre
influências do minimalismo e da Op Art.
A estereoscopia, de modo literal, seria a técnica utilizada
para obter informações tridimensionais à partir das imagens colhidas em duas fontes,
dois pontos diferentes. Em nós, humanos, essas duas fontes são os olhos, e o
que faz o cérebro ao processar essas informações é criar uma sensação visual, fundamental para nos situarmos e
vivermos a espacialidade do mundo. Se a arte é, como muitos ainda creem, um
mero simulacro, aqui reafirma que, na vida, há ilusões absolutamente imprescindíveis.
Renato Torres
Músico, poeta e arte-educadorServiço:
Abertura: 09/12/2014, 19h
Galeria Theodoro Braga - Subolo do Centur
Entrada Franca
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