quinta-feira, 6 de junho de 2013

A arte em seu labirinto


O livro "A arte em seu labirinto" foi lançado dia 24 de maio de 2013, pelo Dr. Afonso Medeiros, no Instituto de Artes do Pará. Encontramos essa entrevista no blog Xumucuis (http://xumucuis.wordpress.com/2013/05/24/livro-a-arte-em-seu-labirinto-de-afonso-medeiros/) e demos uma surrupiada no material. A entrevista foi realizada por Maria Christina. Confira:

O mapa da contradição

O tom bem-humorado de “A arte em seu labirinto” (editora Instituto de Artes do Pará), novo livro  de Afonso Medeiros, começa pela capa, um pastiche do quadro “Abaporu”, de Tarsila do Amaral. A pintura estilizada de um índio sentado ao sol, com referência à antropofagia modernista, virou uma figura feminina com um longo bico de pássaro no desenho de Laura Closset, 10 anos, sobrinha do autor. “Certo dia, ela apareceu com o desenho para mim e disse: ‘Meus coleguinhas não conseguem entender que a releitura de obra não é cópia’.
Aquilo me atingiu. Vinha ao encontro do tema do livro: que definimos a arte o tempo todo. Ogosto de cada pessoa é uma forma de definir a arte, decidir comprar um ingresso de uma peça, até ver um vídeo na internet. E mesmo assim, no meio acadêmico, até entre os próprios artistas, existe essa concepção de que a arte não pode ser definida. É algo complexo. Concordo, mas não é impossível”, afirma o doutor em Comunicação e professor de história da arte da Universidade Federal do Pará (UFPA).
No seu novo livro, um ensaio em tom de crônica sobre história e crítica da arte, o pesquisador adota uma postura diferente da maioria dos acadêmicos, abusando de citações e analogias à cultura pop para tratar de assuntos complexos. “Como afirmo já no prefácio do livro, eu adoto a postura do amador. Refuto a ideia de que a arte é um campo para iniciados, qualquer um sabe do que gosta e pode produzir alguma forma de arte. O que pretendo com o livro é oferecer ferramentas, trazer para a realidade de qualquer pessoa conceitos que ajudam o leitor a definir o que é arte”, diz o paraense de 53 anos. Na entrevista que segue, Medeiros defende uma visão sem amarras da cultura e fala das contradições acerca da produção de arte contemporânea. Confira:
P: Em “A arte em seu labirinto”, você questiona a impossibilidade da definição da arte ao mesmo tempo em que admite que qualquer tentativa de defini-la é um ato insano. Como você apazigua essa contradição que está no cerne do seu livro?
R: É muito simples: não existe alternativa a não ser abraçar essa contradição. A história da arte é formada por uma somatória de contradições. O livro é, na verdade, um apanhado de uma série de questões acerca da definição ou da indefinição da arte. Porque se tornou um mantra no meio da teoria da arte, da discussão acadêmica, de que a arte hoje não pode ser definida. A questão da definição da arte como um todo é tida como muito problemática ou muito complexa. Entretanto, se a gente parar para pensar, vai ver que em todos os momentos alguém está definindo o que é arte. Um júri de salão de arte, ao escolher a obra Y em detrimento à obra X, está dizendo que aquilo é arte e o outro não é. No momento em que o leiloeiro e o marchand negociam uma obra, estão dando um valor à peça, definindo, portanto, o que é arte. Na hora em que o museuescolhe seu acervo. Na sala de aula, quando o professor escolhe que artistas, que movimentos, que estéticas, devem ser estudadas.Portanto, eu acho que há uma certa hipocrisia ou uma fina ironia quando se diz que a arte não pode ser definida e ela está sendo definida o tempo todo.
P: No livro, você foge da sisudez da linguagem acadêmica, citando músicas de Paulinho da Viola, fazendo analogias com o futebol para tratar autores complexos como Michel Foucault e Friedrich Nietzsche. Você acredita em distinções como cultura erudita e popular? Como essas categorias tão diversas interagem no seu livro?
R: A linguagem empregada no livro não é nada acadêmica, embora não deixe de tratar de questões que são técnicas e de conceitos que são complexos, mas de uma forma a respeitar um número amplo de leitores. Não queria que fosse um livro de acadêmico para acadêmico. A tentativa era capturar o espírito de formação de uma série de livros que foi fundamental para a minha geração, na década de 80, que é a coleção “O que é” (Editora Brasiliense).Eu considero que a arte é uma área de fronteiras, que dialoga com muitas outras áreas de conhecimento. Por isso, quebro qualquer pretensão de querer confinar a arte em determinados guetos. Se eu estou trabalhando com relações, com zonas de contágio, eu não quero estabelecer territórios. Então não faço nenhuma distinção entre o popular e o erudito. De Berna Reale a Marcel Duchamp, de regional ao universal, pop e clássico, tudo se mistura de uma forma maleável e de maneira incontrolável. Não dá para estabelecer fronteira entre alta e baixa cultura.
P: Como se deu a ideia inicial do livro?
R: Como sou professor da área há 23 anos, venho escrevendo há muito tempo sobre arte, artes visuais. Eu costumo dizer que eu não sou necessariamente um especialista, eu prefiro ser um generalista, porque a visão do especialista é de aprofundamento sobre um tema, mas que acaba perdendo de vista os horizontes. Como eu prefiro trabalhar com as relações, acabo tendo que tecer, montar, criar cartografias, verdadeiros mapas. Tanto que o título, “A arte em seu labirinto”, que é uma questão cartográfica, de encarar um labirinto de ideias que às vezes se confundem, que parecem um beco sem saída.
P: Tentar definir o que é arte não deve ser tarefa fácil. A que conclusões chega em seu estudo?
R: Eu não caio na armadilha de tentar definir o que é a arte. Na verdade, eu vou discutir as condições para a definição da arte. A partir de que arcabouço, a partir de que ponto de vista ela pode ser discutida. A arte contemporânea estabelece um jogo. É o jogo do ‘diz e do desdiz’. É o jogo da contradição que citei antes. No fim das contas, a arte não é nem aquilo que é dito, nem aquilo que é desdito. É esse jogo entre um e outro.

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