segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Brasil reconhece a contribuição de Miguel Chikaoka à cultura nacional

Égua!
Reproduzindo com satisfação de conhecer e trabalhar com o mestre japonês paraense de coração. Concedido a personalidades brasileiras e estrangeiras, o maior prêmio do governo federal na área de Cultura será entregue ao fotógrafo Miguel Chikaoka em Brasília.

Foto: Natan Chikaoka

Belém, 04 de novembro de 2012 – Nesta segunda, 05, quando se comemora o Dia Nacional da Cultura, o fotógrafo Miguel Chikaoka será condecorado pela Ordem do Mérito Cultural por suas relevantes contribuições à cultura brasileira.
A presidente da República Dilma Rousseff comandará a cerimônia, promovida anualmente em Brasília pelo Ministério da Cultura (MinC) em parceria com o das Relações Exteriores (MRE), da Educação (MEC) e da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
O nome de Chikaoka foi selecionado por uma comissão técnica, que este ano apreciou o mérito de 496 propostas, mas contemplou apenas 41.
Crítica como essência do trabalho – Reconhecido pela sensibilidade em relação aos problemas sociais e o envolvimento político em defesa dos direitos humanos, Miguel Chikaoka chegou em Belém na década de 1980, onde participou de um movimento artístico diverso e atuante, hoje responsável pelo reconhecimento da fotografia paraense no país e no exterior e que culminou também na criação da Associação Fotoativa.
Alguns anos antes, ainda no final da década anterior, quando tentava o doutorado em Engenharia na França, descobriu na fotografia uma forma de expressar inquietações e o estranhamento do mundo, depois responsável pelo seu rompimento com a profissão.
“Na primeira exposição da qual participei, ainda em 1978, acabei selecionando umas fotos bem nessa linha de estranhamento, de um mundo não tão feliz assim, onde há excluídos, solidão. E tive logo uma resposta, porque muita gente escreveu, elogiou e falou o que tinha sentido em relação ao que apresentei naquele momento. E isso me deu uma alegria muito grande porque eu estava podendo me comunicar através de outra linguagem, de uma fala que não era a palavra em si”, conta.
Pedagogia da luz - No decorrer de sua trajetória, o mesmo descontentamento que o levou a abandonar a Engenharia também transformou a sua relação com a fotografia, aproximando-a cada vez mais da área da Educação. E os questionamentos sobre o processo de ensino-aprendizagem também favorecem a constante reflexão crítica sobre a cultura e a sociedade ocidental, pautadas pelo individualismo, pela valorização dos resultados e não do processo em si, assim como da tentativa de domínio do homem sobre o meio e o outro.
“Sempre estive me questionando nesse sentido: nós evoluímos, o mundo evoluiu, a ciência evolui, traz benefícios, mas que benefícios são esses e quem usufrui deles? E, lá pelas tantas, do ponto de vista mais prático, eu percebi que estava sendo absorvido pelo projeto de desenvolvimento de uma sociedade com o qual eu não compactuava”, revela.
Seu trabalho tem sido focado no desenvolvimento de metodologias que fazem do fazer fotográfico um processo que extrapola a simples captura de imagens para a exibição, podendo ser incorporado em vários contextos de ensino.
A construção de uma câmera obscura a partir de uma folha de papel-cartão durante uma oficina, por exemplo, permite trabalhar com os envolvidos temas que tangenciam disciplinas como a Biologia e a Física, na medida em que considera a trajetória e o espectro da luz, assim como o processo de formação da imagem no olho humano.
O trabalho manual, por sua vez, que inclui o recorte e o manuseio do papel pelos participantes, facilita a abordagem das figuras geométricas e podem levar do conhecimento sobre a origem e as características físicas até o histórico e as demais possibilidades de uso do material utilizado.
“Aquilo que eu construo como base é a visão crítica sobre o fazer fotográfico – e não sobre o quê a fotografia expressará, porque acho isso muito pouco diante do potencial de um invento que completou mais de 170 anos. Tanto é que nas minhas oficinas de iniciação eu não apresento fotografias de autor nenhum, nem as minhas, porque não é uma questão central mostrar o que seria o certo ou errado, se a fotografia está boa. Inclusive porque eu aprendi com as crianças e as pessoas leigas que cada um já traz o seu repertório de ideias e imagens que articularão o que se quer falar e mostrar, de acordo com as próprias possibilidades. Apenas é preciso respeitar o tempo necessário para o amadurecimento disso”, explica.
Outro diferencial do método está em facilitar a interação e a troca de ideias e experiências pelo público envolvido, mas sempre com foco nas impressões e características de cada um. “A educação para mim sempre esteve relacionada com oferecer ferramentas para você lidar melhor com aquilo que você é. Não vem de fora, apesar de trabalhar com isso, nem para que alguém veja modificado aquilo que é a sua raiz, as suas referências e a sua essência”, completa.
Pensamento, emoção e espiritualidade - Por trás do método, assumidamente baseado na pedagogia proposta por Paulo Freire, que grosso modo reconhece o papel de protagonista do aluno no processo de aprendizagem, está também a tentativa de reconectar a razão e a subjetividade. A luz, essencial à técnica fotográfica, é assim um elo de reconhecimento das sensações e saberes que ligam as pessoas e os elementos essenciais à própria vida, como a água, a terra, o ar e o fogo.
“A metodologia que eu fui desenvolvendo ao longo do tempo veio no sentido de trazer ou construir um conhecimento, do ponto de vista da ciência e da técnica, mas o olhar é de cada um, o que se expressa é o que a pessoa é, à sua maneira. O exercício do modo de ver pela fotografia é também uma forma de desvelar cada vez mais o sentimento, os sentidos e o que há de mais sensível em cada um”, reafirma.
Ao resgatar a ideia de interdependência entre o homem e o ambiente, a abordagem contempla não apenas a própria noção de espiritualidade, mas incorpora também o inconsciente, o acaso, o silêncio e a inquietação como fundamentos essenciais ao processo de aprendizado, com grande potencial de criar soluções novas para antigas questões.




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