quinta-feira, 2 de junho de 2011

Pinturas de Geraldo Teixeira



Ao troar das matas-cidade

Voz de trovão. Rompe-Mato, rompe mata, rompe cidade. Chove torrencialmente no verde musgo das paredes. Jaz fendida a azulejaria entre limo e abandono. Face sob o sol, o passado agita-se retorcido entre nuvens plúmbeas e velas encarnadas. Doura o Minho em terras onde nem tudo que reluz é ouro. Aqui, Granada nunca será reconquistada totalmente, nesta ímpia e selvagem morada do Encantado. Quem velará por nós, senão uma cidade em eterna transformação? Suor, calor, calor, calor... Excessos. Umidade: casas-corpo, matas-cidade.  Trópico úmido. Geraldo Teixeira rompe tempo e espaço, fende as manhãs e as marcas da cruz. Expostas: a urbe e a obra, o artista nos apresenta uma pintura tão forte quanto sol do meio-dia em Belém. Dói aos olhos, sufoca os sentidos. Aos desavisados, alegria, beleza e cerimônia.
Tabiques, frestas, descamações. Ruínas. Paredes e peles. Mata, verde-mata. Azulejos, outrora impermeáveis, impunham-se como fachadas vítreas. Agora fraturados e envelhecidos, ressurgem como elementos pictóricos a convidar às profundezas do desconhecido, aos porões dos desejos inauditos, aos escuros secretos da noite. À floresta que reina soberana e impassível, palácio das princesas mouras que vieram habitar a Amazônia. Império da Mourama. Invisíveis à luz cegante do dia, seres e formas diluem-se furta-cor. Escuridão. A vibração dos pincéis acusa uma mão experiente e reveladora, onde o domínio da razão dá lugar a um ambiente etéreo muito próximo ao delírio dos viajantes. Ver o que não se vê... Apoderar-se do que não pode ser apoderado... Nudez e insanidade. Febre terçã.
Cobalto,cobre, magnésio, ferro, estanho. Tesouros escondidos nas entranhas da terra surgem na paleta multicor, afastam o horror barroco ao vazio - horror vacui. Promessas de vingança ou infortúnio nas mãos de moira (μοίρα), senhora do destino. Tramas de geometrismo ibérico mimetizam-se com a vegetação dos trópicos, misturam-se aos tons das folhagens e troncos ancestrais. Confundem nossos sentidos: escutamos com os olhos. Do aparente silêncio de cada textura, ouvimos o troar, distante e sedutor, das princesas mouras encantadas: Ai moro ê moreogama/Ai moro ê moreogama/família de moro ê moreogama/ família de moro ê moreogama...


Armando Queiroz
Maio de 2011
  

 

 
















ALÉM DO JARDIM   
Pinturas de Geraldo Teixeira na galeria do CCBEU  
Trav. Padre Eutiquio,1309
Vernissage dia 08 de junho  19 h
Serão mostradas 20 obras em técnica mista s/placa.

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