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Zine do ABC Paulista |
Tenho duas amigas jornalistas. Antes de começarmos as entrevistas nesse blog, fui à elas pedir auxílio, queria saber como eu poderia fazer uma boa entrevista. Uma delas me respondeu: “Vá fazer quatro anos de jornalismo em uma Universidade!!” Algo muito motivador e estimulante... pensei. Depois de mais algumas investidas, ví que ela por algum motivo, não queria mesmo me ajudar, então, começamos aqui no blog a partir de um antigo lema punk: “Faça você mesmo!”.
É com essa frase que inicio essa matéria sobre fanzines. Para aqueles que não conhecem, fanzine, era...digamos...o avô do blog. Era uma publicação alternativa e despojada, underground mesmo, uma revistinha toda colada, datilografada, montada em papel A4 ou em dimensões menores, com imagens recortadas de revistas, fotos de amigos, desenhos toscos (aliás, tudo era tosco), entrevistas com bandas locais, muita militância anarquista, textos niilistas, informações sobre shows de bandas de rock de outros Estados, manifestos vegans, feministas, carecas, anarco-punk`s, enfim, era uma maneira de divulgar o que ocorria no sub-mundo da cultura alternativa ou underground, ou dar voz a discursos de margem.
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Zine de skate do Nordeste |
Em Belém os skatistas e os punk`s tinham seus zines e divulgavam sua culturas específicas, lembro do Animal skate zine (infelizmente ele só foi até a segunda edição), que divulgava no inicio da década de noventa entrevistas e fotos com skatistas locais. As fotos eram feitas por um cara chamado Amaury, fotos de boa qualidade. Alguns ex-skatistas trilharam outros caminhos, como é o caso do Ruy Montalvão, integrante da banda Rádio Cipó ou tornaram-se Promotores de justiça, como é o caso do Márcio “Ollie air”. Os zines punks, como o: “Ovelha negra” e o “Impulso ingovernável” (ambos do Matheus), o “Foco de revolta” do Sandro e o zine “Secreção esporádica” do Jaime Catarro (vocalista da banda Delinqüentes), divulgavam manifestos e bandas. Sem falar no sistema de compra e venda de adesivos, fitas cassetes, camisas e outros zines, pelo correio.
Os punks reuniam-se, entre outros locais, na praça das Mercês ou no Centur: Matheus, Sérgio, Tijolinho, Pau de rato, Fábio, eram alguns dos caras da época que divulgavam cada um a seu modo o movimento. Aliás, o Sérgio ainda divulga um material muito bom, ele vende uns dvd`s ali na frente do colégio Gentil Bitencourt na Av. Nazaré. Haviam também fanzines feministas e headbanguers. Lembro de um em especial que era confeccionado com desenhos e textos feitos com carvão, não recordo o nome do zine agora, mas, sei que o cara que editava era o Bala, vocalista da antiga banda Stress (tida como a primeira banda a gravar um Lp de heavy metal no Brasil em 1975).
Ah, sim, existia um sistema de compra e venda clandestino. Malocava-se algumas cédulas em um pequeno maço de papel dentro da carta e esperava-se que o cara lá em Porto Alegre, por exemplo, mandasse o zine, a fita cassete (demo), o Ep ou outro material via carta para sua casa, e geralmente era certeza, a coisa chegava, pois os caras queriam divulgar o material. Também existia um circuito de trocas, nós mandávamos zines daqui e eles mandavam zines de lá. A compra de fanzines geralmente era feita através de selos, era só passar uma camada de cola em cima do selo, para que quando chegasse no destinatário, ele fosse retirado usando água, que saia juntamente com o carimbo do correio, para ser usado de novo, de novo e de novo em outra carta.
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Um flyer do meu zine sendo divulgado em um
zine de São Paulo. |
As divulgações dos outros zines ocorriam através de flyers que vinham soltos dentro das cartas, de todas as cores e tamanhos, lembro que os do sul do país eram mais descolados e criativos e o dos punks do ABC paulista eram bem toscos e agressivos, lembro de muitas bandas que estão aí hoje na mídia, que divulgavam na época seu material via correios, zines e flyers, bandas como: Los Hermanos, Charlie Brown Jr, a falecida banda Raimundos, Pato Fu, O rappa, Boi mamão, etc.
Muitas boas bandas cresceram no underground e morreram por lá mesmo, seguindo o ideal de Yan Mckei líder da banda Fugazí e do antigo Minor Threat (ícones do movimento straigh edge contra o consumo e as corporações), Safári Hambúrguer, I.H.Z, rapeize lá de Santos/SP, que sempre mandaram ótimas bandas para o cenário alternativo. Essas e outras bandas fizeram muito sucesso na cena alternativa, e divulgavam seu material fonográfico e ideológico por meio dos zines e revistas especializadas (não estamos falando de revistas nos moldes da antiga Bizz). Negavam vender seu material para a mídia, cresceram e morreram dentro dos zines e divulgações marginais.
Hoje temos algumas bandas seguindo uma linha de raciocínio similar utilizando a internet. A banda performática “Teatro mágico” é uma delas, os caras têm uma ideologia (se é que posso usar tal termo), por trás das apresentações, tem um certo ativismo que rejuvenesce um tipo de atitude típico das bandas e zines que aconteciam pelos correios. Também sei de um movimento chamado Teenage Pop Fanzine Revolution (Fonte: revista Coquetel molotov, 2° semestre, 2008, n° 8), que vem ressuscitando a cultura dos zines. Os jovens fazem os zines ainda no papel e os xerocam, tal como era feito na origem, vai aí algumas dicas de uns bons zines dessa nova safra: Bottle Rocket, Sapricot e Iconoclastic Cardies.
Em Belém tiveram vários zines, mas aqui em casa eu tenho mais zines de fora, e apenas alguns daqui de Belém, vai aí dois dos zines que circularam na década de noventa por aqui, e claro, um deles foi o meu....rsrs...desculpem, eu não perderia essa chance.
O
Banthis – Skate rock zine, foi um zine que eu criei e durou três edições entre os anos de 1995 e 96, tinha entrevistas com bandas, endereços, textos ativistas, fotos da galera de skate, endereços de muitas bandas e zines de fora, lembro que na época conheci o Júlio da banda Pinhead (Curitiba) e o Rodrigo Lariu, hoje dono de uma gravadora e produtora. O cara tinha um zine só sobre cinema chamado “Midsummer Madness”, bandas, filmes, shows e zines, um dinheiro, custava o Midsummer via real malocado na carta. O “Tinoko” foi outro zine que existiu em Belém na década de noventa, feito pelo casal (na época): Vladmir Cunha e Gisele Vasconcelos. O zine deles era bem divertido, tinha alguns colaboradores, estórias malucas meio dadaístas, quadrinhos, bandas de rock, biografias, etc.
Em Belém tinha também o “Ponto de fuga” local que reunia desenhistas (a idéia na verdade partiu deles, Joe Bennett , Marcelo Marat, etc), punk`s, universitários e skatistas. Consegui um texto de um blog chamado "Ivancarlo.blospot.com" sobre o ponto de fuga, segue: "O Ponto de Fuga foi o primeiro grupo de quadrinhos de Belém. Graças às exposições e fanzines realizados pelo grupo que toda uma geração despertou para a Nona Arte. Só para ter uma idéia, durante a primeira exposição, várias pessoas nos procuraram para perguntar se era verdade que os quadrinhos eram feitos por seres humanos (eles achavam que roteiro e desenho eram feitos por robôs). Hoje, Belém é conhecida como terra de bons quadrinistas. Muitos desenhistas trabalham para os EUA (o pioneiro e mestre dessa garotada é o compadre Joe Bennett), gente trabalhando para ao Europa (como o amigo Miguel Delalor), outro investindo em editais (como o pessoal de Belém Imaginária e Encantarias) e outros publicando suas revistas com a cara e a coragem, como o pessoal do Quadrinorte e o Alan Yango. É tanto gente produzindo bons quadrinhos que com certeza estou esquecendo alguém." (Por Ivan Carlo). O Ponto de fuga teve uma casa em frente ao antigo colégio Rutherford, era uma espécie de Squatting onde aconteciam exposições de desenhos, pinturas, teatro, música e algumas outras viagens. Mas, pensando bem, acho que isso é assunto para outra matéria...see you later.
Ricardo Macêdo.
Colaboraram nesta matéria : Fábio (ex-punk), Sandro (ex-punk), Sérgio e Bruno Cantuária.
Agradecimentos: Sérgio, Fábio, Sandro, Matheus e a Lu Magno que permitiu escanear algumas imagens em seu computer.
Mais informações sobre o "Ponto de fuga"
http://ivancarlo.blogspot.com/2009/07/ponto-de-fuga.html
http://monomanniaco.blogspot.com/2008/08/e-zine-cafagestagem-e-o-zine-ponto-de.html